Chuva no RS afeta entrega de 40% de leite para a indústria. A estimativa é da Associação dos Criadores de Gado Holandês do Rio Grande do Sul (Gadolando) e do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados (Sindilat-RS).
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“Muitas propriedades estão alagadas e isoladas devido à queda de barreiras, o que significa o não recolhimento de leite e, portanto, o não abastecimento à indústria”, alerta o presidente da Gadolando, Marcos Tang.
Com produção diária de 11 milhões de litros de leite enviada para a indústria, de acordo com o Sindilat-RS, o percentual de 40% representa em torno de 4,4 milhões de litros de leite.
Diogo Ferraboli, produtor de leite no município gaúcho de Anta Gorda, conta que “a situação está feia” na propriedade. “Jogamos fora 12 mil litros de leite”, lamenta. E continua: “hoje de manhã nem conseguimos ordenhar as vacas, por não ter mais combustível [usado nos geradores para ordenha mecanizada], não temos acesso às estradas, que estão trancadas por deslizamento ou queda de pontes”.
Segundo ele, foi possível ordenhar as vacas na sequência do dia, quando conseguiram um pouco de combustível. O produtor acrescenta que as vacas estão adoecendo e morrendo, falta energia elétrica e água, além de ração para os animais.
Diogo pondera que a prefeitura estava tentando liberar, nesta sexta-feira (3/5), um acesso para a comunidade: “estamos rezando para que dê certo, porque senão as próximas horas e os próximos dias serão tristes”.
O presidente da Gadolando reforça que a falta de combustível e de alimentação está afetando inúmeros produtores: “sei de propriedades, com grande número de vacas, que estão ordenhando uma vez ao dia só porque têm pouquíssimo combustível. Não conseguem buscar mais e estão tocando os geradores com este combustível. Os produtores estão fazendo alguns trajetos a pé, pegando óleo em pequenas quantidades, enquanto for possível”.
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Ele ainda pontua que há relatos de diminuição de ração para os animais, com falta do produto em estabelecimentos comerciais. A recomendação é para que seja priorizada a alimentação dos suínos – que comem exclusivamente ração -, tendo em vista que o gado de leite pode ser alimentado com silagem.
Em Bento Gonçalves, o casal de produtores de leite Simone e Vilmar Brambilla aproveitou os momentos de trégua da chuva, nesta sexta-feira, para reconstruir a encosta de pedra em trechos da via que dá acesso à propriedade e garantir a captação do leite produzido na fazenda. “Estamos consertando alguns trechos, por conta própria, com retalhos de pedra do muro que foi destruído pela enxurrada”, comenta Simone.
Ela ressalta que, com as pedras no caminho, o leiteiro avisou que não conseguiria fazer a coleta do produto, que ocorre a cada dois dias. A função do muro era, justamente, conter a água em trechos que são marcados por ladeiras na propriedade. “Para nós, o problema maior tem sido nas estradas onde o transportador passa. Foi bastante chuva, prejudicou muito”, comenta.
Com produção entre 900 litros a 950 litros de leite por dia, o plantel de 50 vacas – secas e em ordenha – é criado no sistema semiconfinado. Com a chuvarada, o pasto recém-plantado foi levado pela correnteza. “A gente mal tinha se recuperado da enchente anterior”, lamenta. Simone observa que foram três episódios de intempéries em oito meses, que deixaram um resultado desafiador: “o custo é mais alto que o lucro, o que tu investe, tu perde”.
Para o Ezequiel Dick, produtor de Carlos Barbosa, que tem um plantel de 50 animais em confinamento, com 31 em ordenha, e produção de cerca de 930 litros de leite por dia, a maior preocupação é o pasto de azevém, que estava começando a brotar e agora terá em torno de dois meses de atraso no ciclo.
Dificuldades
Guilherme Portella, presidente do Sindilat-RS, explica que, com muitas estradas vicinais obstruídas, a captação do leite no campo resulta em dois cenários: o produtor que não consegue entregar a produção à indústria e o atraso na captação do leite que é entregue. “Há caminhões tendo que fazer um caminho muito maior para chegar ao destino”, aponta.
Para evitar ainda mais desperdício de leite, a Gadolando, em parceria com o Sindilat e a Associação das Pequenas e Médias Indústrias de Laticínios do Rio Grande do Sul (Apil), com apoio da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi), determinou uma operação emergencial no recolhimento do produto. O acordo prevê que todo produtor de leite do Estado pode entregar a produção para a indústria que conseguir chegar primeiro à propriedade.
“É complicado, mas é melhor que botar o leite fora. Se tem uma indústria com acesso, que o leite vá para esta até abrir as estradas”, diz o comunicado enviado pela Gadolando aos produtores via whatsapp. “Estamos sensíveis à situação, a prioridade é não deixar o produtor sem entregar o leite, e receber por isso”, enfatiza Guilherme.
O dirigente do Sindilat-RS destaca ainda os problemas que estão sendo enfrentados pelas indústrias do Estado, afetadas por quedas de energia elétrica e contaminação de poços de água e de estações de tratamento de efluentes. Os insumos também representam uma dificuldade.
Segundo ele, há registro de falta de embalagens, que tiveram a entrega comprometida. “Isso gera um problema para escoar o leite que está nas indústrias, com estoques cheios não tem como seguir com o processo de produção”, explica. Além disso, há indústrias que tiveram a estrutura física atingida ou que os funcionários não estão conseguindo chegar ao trabalho.
Com foco na proteção da vida humana e na segurança, Guilherme diz que é cedo para avaliar questões como desabastecimento ou alta nos preços do leite. “Não temos esses dados contingenciados, mas certamente terá impacto na produção. Estamos no meio da crise, nossa preocupação é tentar captar o leite para não desamparar o produtor”, afirma.
A indústria – ele pondera – não pode deixar de produzir leite, que é um alimento. Por isso, apoiar nas condições e clima de trabalho está entre as diretrizes da entidade neste momento.